Um estudo inédito realizado no Hospital Estadual Pérola Byington, da Secretaria de Estado da Saúde, revela o perfil das mulheres vítimas de abuso sexual que engravidam no Estado de São Paulo. O levantamento foi feito com base em 936 pacientes atendidas na unidade ao longo dos últimos 15 anos pelo projeto "Bem-Me-Quer", promovido pelas secretarias de Estado da Saúde e da Segurança Pública.
Do total de mulheres atendidas no Pérola, 88,9% admitiram não ter procurado orientação médica imediata, ou seja, nos cinco primeiros dias após a violência. Nesse período, seria possível o uso de um contraceptivo de emergência (pílula do dia seguinte) para evitar a gravidez indesejada.
"O dado sinaliza que o trauma faz com que a primeira reação das mulheres seja a reclusão. Só depois, quando percebem a gestação, é que elas passam a tomar atitudes e enfrentar o problema", afirma a psicóloga e mestre em Saúde Pública Daniela Pedroso, autora da pesquisa.
Dos 11,1% que recorreram ao serviço de saúde imediatamente, 38,6% não quiseram a prescrição da pílula por opção própria. Outro dado chama a atenção: das 200 pacientes que tiveram o pedido negado pelo serviço de saúde para realizar o abortamento legal, 39% estavam com idade gestacional avançada (chegaram para atendimento após 22 semanas de gravidez ou com o feto pesando mais de 400 gramas).
O perfil traçado pelo hospital apontou que a mulher vítima de abuso sexual que engravida tem idade média de 22,2 anos, cor branca (61,2%), solteira (76,3%), com ensino fundamental incompleto (37,4%) e emprego formal ou informal (34,3%).
O projeto "Bem-Me-Quer" dispõe de equipe multidisciplinar capacitada para oferecer ajuda médica, psicológica e realizar exame de corpo de delito, simplificando o processo de notificação às autoridades.
As mulheres estudadas passaram pelo atendimento de 1994 a julho de 2009. Todas tentaram na Justiça o direito de realizar aborto, concedido mediante uma série de restrições em casos de abuso sexual. Até 2005, os atendimentos do "Bem-Me-Quer" representavam 25% das mulheres de todo o País nessas condições e 37,5% da Região Sudeste. O serviço é o único no Estado de São Paulo.
O método mais utilizado entre as 608 mulheres que realizaram aborto legal foi a aspiração intrauterina (48,4%), que demanda menor tempo de internação (média de 1,4 dia). A laparotomia, espécie de cesariana, foi usada em 10,2% dos casos. Em geral, esse procedimento, mais invasivo, é usado em mulheres cuja gestação está prestes a vencer o período permitido por lei.
Agressor único e desconhecido
Em 61% dos casos estudados, o autor era desconhecido da vítima e em 92%, agiu sozinho. Entre os autores conhecidos, destaca-se um membro da comunidade em que a vítima reside, que corresponde a 5,2% dos casos. O ex-parceiro foi o autor da violência em 3,5% dos casos, e o padrasto, em 3,4%.
"Nas ocorrências em que não houve aborto, em geral por demora na procura pelo atendimento, segundo apontou o estudo, os autores da violência eram conhecidos, em sua maioria. Isso denota que a carga emocional faz com que as vítimas demorem mais a procurar ajuda", destaca Daniela.
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